A decisão leva em conta, entre outros aspectos, a recente Lei Geral de Proteção de Dados
Em 03 de março de 2022, a Subseção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a GPS Logística e Gerenciamento de Riscos S.A. não utilize bancode dados ou preste informações sobre restrições de créditos de candidatos a emprego em transportadoras de carga, a partirda vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD - Lei 13 709/2018). Para a maioria do colegiado, os cadastros de serviços de proteção ao crédito não devem ser usados como critério para a contratação de motoristas.
Varredura
Em ação civil pública ajuizada em 2012, o Ministério Público do Trabalho (MPT) relatou que a GPS, , com sede em Osasco (SP), fazia “verdadeira varredura” na vida pessoal dos motoristas, levantando dados relativos a restrições de crédito (Serasa/SPC), e formava um cadastro que continha, além da
qualificação pessoal e profissional, as informações desabonadoras eventualmente obtidas. Posteriormente, esse cadastro era fornecido às transportadoras e seguradoras, por ocasião da contratação.
Inquéritos civis conduzidos pelo MPT demonstraram que as transportadoras deixavam de contratar motoristas com base nessesrelatórios ou os impediam de transportar cargas para determinadas regiõesem razão de suas restrições creditícias. Para o órgão, a prática, além de violadorado direito à privacidade, é discriminatória em relação aos que apresentem algum tipo de apontamento.
Evitar sinistros
A GPS, em sua defesa, sustentouque todas as informações são públicas e obtidas de forma lícita.Segundo a empresa,o gerenciamento de risco visa equalizar as relações entre os envolvidos e é uma forma deevitar a ocorrência de sinistros e de diminuir o preçodos seguros.
Outro argumento foi o de que, na condiçãode gerenciadora, não tinha o poder de impediro transporte da carga nem a contratação dos motoristas, “até porque não tem nenhuma ingerência sobre as empresas de transporte, seguradoras ou embarcadores”.
Livre iniciativa
A pretensão do MPT foi julgadaimprocedente pelo juízo de primeirograu, pelo TribunalRegional do Trabalhoda 10" Região(DF-TO) e pela Sétima Turma doTST, que não verificou ilicitudeou irregularidade na atividade da GPS. Segundo a Turma, o uso das informações pelas empresas que as adquirem(no caso, as transportadoras) é que pode caracterizar condutadiscriminatória, e condenara gerenciadora seria impedi-la de desenvolver atividade lícita, o que iria de encontro ao princípio constitucional da livre iniciativa.
Discriminação
O relatordos embargos do MPT ã SDI-1, ministro AlbertoBresciani (aposentado),assinalou que a Lei 11.442/2007 proíbe a utilização de informações de proteção ao créditocomo mecanismo de vedação de contrato entre o transportador autônomo e a empresa de transporte rodoviário de cargas. Emboraseja possível defender que a vedação é dirigida apenas ao empregador, e não à empresa que fornece os dados, ele considera que, ao incluir esse elemento como de risco ao contrato e repassá-lo até mesmo à seguradora, há potencial infração à lei.
De acordo com o relator, cadastros como os do Serasa/SPC destinam-se ã proteção do crédito a ser concedido por bancos, particulares e associações comerciais e não devem ser usados para aferição da empregabilidade do motorista ou da probabilidade de que venha asubtrair as mercadorias transportadas. “Se não há condenação por crimes contrao patrimônio, como o estelionato, não há motivospara questionar o caráter do simples devedor, cujas razões para a inadimplência fogem, no mais dasvezes, ao seu controle”, afirmou.
Proteção de dados
Outro fundamento adotado pelo relatorfoi a Lei de Proteção de Dados (LGPD), segundo a qual as atividades de tratamento de dados pessoais deverão observar a boa-fé e princípios como os da finalidade (propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular), da adequação (compatibilidade com as finalidades informadas ao titular), da necessidade (limitação ao mínimo necessário) e danão discriminação (impossibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos). “Se se está diante de uma manipulação de dados pessoais tendente a gerar uma cadeia de quebra da isonomia e de discriminação, não há que se falar em prevalência do direito fundamental à livre iniciativa”, assinalou.
No caso,o ministro observou que a GPS usa os dados com fim diverso do que motivou sua criação, a fim de indicar ao empregador e à seguradora um maior risco na contratação ou na distribuição de serviços para determinado empregado. “Utilizar ou fazer utilizar o cadastro para qualquer outro fim que não a proteção ao fornecimento de crédito, após a vigência da LGPD, é ilegal”, concluiu.
Além de condenar a empresa a se abster de utilizarbanco de dados e de prestar informações sobre os candidatos a partir da vigênciada LGPD (14/8/2020), a SDI-1 impôs multa de R$10 mil, por candidato, em caso de descumprimento e estabeleceu indenização por dano moral coletivo, em valor a ser apuradona execução. Ficaram vencidos a ministra Maria Cristina Peduzzie os ministros Caputo Bastos e AlexandreRamos e, em relação à indenização, parcialmente, os ministros Lelio Bentes Corrêa e José Roberto Pimenta, que propunham a fixação do valor de R$ 400 mil.
(GL, CF)
Processo: E-RR-933-49.2012.5.10.0001
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